Fonte da Carranca no lugar do Couto - San Petri Gondarém |
Numa
encosta íngreme e decorada com uma “cara de pedra”, a «Fonte da Carranca”,
arrebita para o lugar da «Coriscada», sem qualquer pudor ou vergonha, na sua
natural exuberância. Nascente de água fértil, ladeiam esta “carranca”, duas singelas
conchas esculpidas ao lado da sua “cara de pedra”, ligeiramente esbatidas, que fazem apelo aos “Caminhos
de Santiago”; a cuja fonte, nenhum romeiro resistia, em pleno Verão, tanto, à frescura
de tão precioso líquido, como, a este refrescante lugar. O uso da água, este “bem
comum” de direito consagrado, que para os romanos tinha enorme valor, dos quais nos recordamos com as suas termas, esmoreceu durante parte da Idade Média. Somente,
a partir do século XIV, em Portugal, se começa a valorizar estas nascentes de
água, suas estruturas e chafarizes, tão importantes para a vida das pessoas,
deixando de consumir a água dos ribeiros. Aliás, hábito e costume que perdurou
até metade do século XX, em certos locais de San Petri Gondarém. A água
canalizada era um “luxo”, ao qual nem todos tinham acesso; por isso, os "cântaros e as cantarinhas", como as suas "bilhas de água", faziam as delícias das moçoilas que iam à fonte.
Desconhece-se, se Duarte de Armas e seu escudeiro, no seu “Livro das Fortalezas” (1509-1510)
omitiu a referência às fontes de Santiago, ou, até, à simples «Fonte da Carranca”, nos seus relatos históricos para o rei D. Manuel
I. Parte deles, perderam-se na sua rápida viagem, através do Reino, e entre Caminha e Valença; ainda que, não esqueça de referenciar a fortaleza de Cerveira,
e, elogiar os benefícios do fontanário valenciano ("fonte da vila"). Todavia, a singeleza desta “Fonte da
Carranca”, de cuja história resta pouca memória, não se pode dissociar da casa senhorial que domina a colina do lugar
do Couto, em que está inserida, já que os senhores medievais e clérigos detinham os direitos sobre as águas dos seus territórios, no entanto, aberta à passagem dos peregrinos.
No
alto do morro do lugar do Couto predomina uma casa senhorial de estrutura
granítica, com amplas janelas, que é um “ex-libris” de segurança. Não é
qualquer tiro de canhão que derruba as grossas paredes de granito desta
estrutura. Aliás, nenhuma parede de alvenaria, nas redondezas, rivaliza com a
dupla fachada de pedras de granito que se erguem, quer no seu lado interno,
quer no seu lado externo. Autêntica fortificação, “domus fortis”, ou, casa
forte, tanto pode remeter para as construções medievais dos senhores do século
XIII, fazendo jus a qualquer antigo “couto”, que perdura na sua toponímia,
como também, a qualquer habitação de gente rica e abastada do século XVI.
Descendendo desta antiga casa senhorial, por
uma estreita escadaria, encontra-se esta singela “bica de água” em
granito lavrado, com a sua carranca, e, duas conchas esbatidas pela erosão, por onde jorra um contínuo fluxo deste precioso líquido,
oriundo do encanamento de nascente de uma fraga, que, infelizmente, foi substituída
por um tubo plástico. As nascentes de água e suas fontes deram origem à fixação dos seus habitantes e moradores. O conjunto de nascentes de água de Gondarém é vasto, mas nenhuma detém esta simbologia; (sem esquecer as antigas "tabuletas" de rega). A "cara de pedra", ou "carranca" simboliza a máscara. Na tradição viking, a carranca era utilizada, na proa dos seus barcos, como meio de afugentar os maus espíritos das águas dos rios. Deste modo, a "carranca" está associada às águas e suas fontes, e, ao poder oculto dos seus benefícios e sortilégios.
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