Desde
o século XVIII, que a estátua de Sam Payo tinha tido acolhimento na capela do Bom Jesus
de Gondarém, com "altar e digno reposteiro", tornando-se num
santo de grande devoção, ocupando um lugar de padroeiro. A festa, que estava dedicada ao “Bom Jesus”, e, que tinha como "símbolo a
cruz" (via crucis), perdeu lentamente o seu brilho e fulgor, por causa deste santo intrometido e adotivo, que, furtivamente
tinha entrado na capela do Senhor. Paulatinamente e sem pedir licença, também, por causa da sua ousadia, que a devoção popular lhe devia, (de tal forma que não deixava ninguém indiferente ao seu olhar), este santo, rapidamente, iluminou o seu lugar.
Santo festivaleiro, que misturava a oração e a romaria, só encontrava descanso em corações cheios de alegria. Daí, que a nível popular, a festividade tenha trocado de nome, por imposição e virtude deste santo, vindo das terras de Santiago, vestido de peregrino e romeiro.
Os "tempos de peregrinação", que, outrora pertenceram a Santiago, pelos seus caminhos e atalhos, transpuseram-se para este pequeno embaixador de "Matamouros", que a devoção popular conservava, através deste santo na tradição que o tempo transformara, após a ruína, desleixo e abandono da sua casa, ou, convento, lá no alto daquele monte.
Este santo de "rezar e folgar", em algum sítio tinha de ter lugar. Os seus devotos já não podiam subir ao monte e celebrar aqueles bons tempos em que a sua festa tinha lugar. Por isso, albergaram-no nesta capela do "Bom Jesus", pouca habitada e de pouco uso. A festa do santo começou a brilhar, e a sua festividade atraía toda a vizinhança, quer deste lado ou do outro lado do rio Minho. Se «de Espanha, nem bom vento, nem bom casamento», Sam Payo deixava essas querelas para as dinastias, porque a sua graça e alegria a todos irradia, quer portugueses, quer galegos, de noite e de dia. Ao invès, aviva-os na sua memória, que este santo fazia parte da sua história, que, por graça de franciscanos tinha vindo com eles, em tempos remotos e arcanos.
A sua devoção de "santo e padroeiro de romarias" ultrapassara a severa penitência que o “caminho da cruz” impunha com o “Senhor Bom Jesus”. Os severos sermões e as duras ameaças de um Inferno para além desta vida, não se compadeciam com as agruras de cada dia. A vida "difícil e pobre" não suportava quem a cobre com o "fogo eterno", a quem já nesta terra tem as suas labaredas. Se, a vida, por vezes, era um inferno, ter outra vida, com "lume eterno", era demais, para estes pobres mortais. Por isso, por mais amor que se tivese ao Bom Jesus, procurava-se outra luz para o "caminho da cruz", ainda que fosse um pequeno luzeiro neste "santo festivaleiro". E, do seu anterior local de devoção, que também foi de alegre peregrinação, emoldurava-se o "monte sacro" do Bom Jesus com outro santo e outra cruz. Uma cruz mais popular, de "rezar e folgar", tornada em romaria, que irrompia, quer de noite, quer de dia. Recordava-se com remota ternura, os velhos tempos das caminhadas, quer a pé, quer em “carradas”, pelas fragas, pelo mato e pinhais, atravessando densos matagais, onde os lobos famintos faziam os seus arraiais.
Um dia, o santo apareceu fora da igreja, ao vento e à chuva, fora do seu lugar, parecia um santo a tiritar. Um gélido nicho exterior, na branca parede da capela, deu-lhe um sítio para morar. Mas, o frio do Norte e a sua chuva da noite, moveu o coração de um devoto do santo que sofreu por tal desgraça, sorte e desdita. Dorido na sua dor e cheio de fervor, este audaz morador colocou no santo um cobertor, de "palha e de pastor", temendo qualquer delator.
N.B. Aos "tempos de ditadura", juntavam-se os "tempos de tonsura"