Seguidores

sábado, 23 de janeiro de 2021

Europolitique: O "Padroado" da Igreja e Abadia de São Pedro de Gondarém

 


Igreja paroquial de Gondarém - V.N.C.

Em 1580, como relata o Arquivo Distrital de Viana do Castelo, “São Pedro de Mangoeiro” encontra-se “partido em duas partes, a sem cura (que) é do Arcebispo e a com cura de padroeiros leigos”, referindo-se às duas igrejas existentes neste território. Pouco a pouco, “São Pedro de Gondarém” começa a adquirir a sua identidade e independência, apesar da sua anterior constituição, ou seja, em 1258  ao (bispado de Tui), e em 1320, segundo o censo de D. Dinis. O antigo lugar do “Passal”, junto à Igreja, remete para uma antiga abadia, que caracterizava este padroado, que na extensão dos seus terrenos se juntava aos “Caminhos de Santiago”, onde se albergavam graciosamente as comitivas reais.

Durante vários séculos, a igreja ou abadia, melhor dizendo, este “Padroado”, incluía várias casas (por exemplo: casa senhorial, casa de lavoura e dos caseiros), e diversos terrenos, que estavam dependentes dos “senhores leigos” e dos “senhores eclesiásticos”. No transitar do século X, presume-se que surguissem os senhores detentores destes  territórios, que administram em colaboração com a coroa: as ditas “honras”. (Mais tarde surgem os padroados, por intervenção de D.João III, a partir do ano de 1532).

Em relação ao “Padroado” de Gondarém presume-se, que metade dos seus rendimentos eram distribuídos, equitativamente, quer pela Igreja (“senhores eclesiásticos”: padre, abades, notários apostólicos), quer pelos “senhores leigos” (Cerveira, Pereira e outros), apesar dos seus conflitos e litígios sobre a fundação e sobre os direitos de propriedade. Os “senhores leigos, que se constituíam como fundadores do Padroado usufruíam do direito de "fazer justiça", de aceitação e apresentação do seu padre perante o bispo, em que transitavam rendas, títulos e benefícios

Certos historiadores defendem que na Idade Média, a instituição mais rica da Europa era a Igreja Católica, detentora de 2/3 das terras. Desde Dona Teresa que muitas doações eram feitas a igrejas, abadias, conventos e mosteiros. Todavia os “negócios” entre os “senhores eclesiásticos”, por vezes, “bispos de espada na mão”, e, os “senhores leigos”, nobres e fidalgos da Corte, mantiveram um equilíbrio, cujo caso exemplar reverte neste padroado. Os seus pergaminhos davam origem à constituição de “títulos”, ou, “benefícios” que engrandeciam os seus detentores ou personagens.  As contendas davam origens a sentenças cíveis, ou, episcopais, quer a favor dos “senhores leigos”, quer na sua afirmação de titularidade eclesiástica, caso do “notário apostólico”, em 1603. Por isso, exemplificam-se algumas dessas situações:

 

Os títulos do Padroado:

 Em.1603, o “notário apostólico”, Pero Guimarães  Pereira, morador na freguesia de Gondarém, decide construir a Capela de São Sebastião. (Arq. Distrital de Braga, 12.08.1603).

Em.1661, pedido de «título da abadia de São Pedro de Gondarém, da comarca de Valença, a favor do Reverendo Bento Maciel de Araújo, clérigo de missa, natural de Sa…(Sapardos)., comarca de Valença. (Arq. Distrital de Braga, 22-12.1661)

Em 1738, pedido de «registo do título paroquial igreja e abadia de São Pedro de Gondarém, a favor do Padre Sebastião Pita de Castro, da vila de Caminha, comarca de Valença». (Arq. Distrital de Braga, 10.12. 1738).

Em 1745, pedido de «título e mandado de capienda possessione da paroquia igreja de São Pedro de Gondarém, a favor do Reverendo João Lobo Barreto, sacerdote da vila de Caminha. (Arq. Distrital de Barga, 14.07.1745

Em 1780, pedido de «título da Igreja Abadia sem cura de São Pedro de Gondarém a favor do Reverendo Manuel José Leite Pereira, desembargador na Relação desta Corte». (Arq. Distrital de Braga, 27.10.1780)

Em 1803, pedido de «título da Igreja de São Pedro de Gondarém a favor do Reverendo António Pedro Pacheco» (Arq. Distrital de Braga, 29.11.1803).

Em 1823, pedido de «título da paroquial igreja abadia de São Pedro de Gondarém da comarca de Valença, a favor do Reverendo José Maria Pacheco, da freguesia de Santa Eulalia de Barrosas, Lousada. (Arq. Distrital de Braga, 01.09.1823

Em  1839  é constituído o «Juízo de Paz e Órfãos da Freguesia de Gondarém (Vila Nova de Cerveira). Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo, 01.01.1939).

Em 1911, na separação da Igreja/Estado é elaborado o "arrolamento dos bens culturais situados na freguezia de Gondarém, concelho de Vila Nova de Cerveira, constado de: Igreja Paroquial de Gondarém, Capela do Santuário do Calvário, Capela de São Tomé e São Sebastião», pelo Ministério da Justiça e dos Cultos»   (Arq. Nacional Torre do Tombo, 18.07.1911, Liv. 92, fl.142-156). Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo)

Em 1928, Retificação do arrolamento anterior, em que se faz referência a uma casa ao lado do Calvário, que: «está arrendada para a escola da freguezia de ensino oficial e rende anualmente dezasseis escudos». (Arq. Nacional da Torre do Tombo, 15.03.1928)

 Os benefícios do Padroado

 Em 1716, pedido de «título do benefício simples sem cura de São Pedro de Gondarém, comarca de Valença, a favor do Reverendo Reitor Luís Alves de Figueiredo, Bispo hispalense e nosso Coadjutor» (Arq. Distrital de Braga, 16.09.1716)

Em.1751, «título de benefício simples da Abadia sem cura de São Pedro de Gondarém da Comarca de Valença, a favor do Reverendo Padre António Pedro Pacheco». (Arq. Distrital de Braga, 02.03.1751)

Em 1766, «registo de carta de capelão de um benefício simples na igreja de São Pedro de Gondarém, a favor do Padre João Alves, da dita freguesia, pelo tempo de um ano» (Arq. Distrital de Braga. 11.03.1766).

 Sentenças sobre o Padroado

Em 1648, Francisco Pereira da Silva (terceiro morgado da Casa de Bertiandos) moveu um processo cível contra o “Padroado” de São Pedro de Gondarém, “readquirindo” o título de “padroeiro”, por afinidades familiares. (Esta reivindicação não deve estar isenta do papel exercido pelo “notário apostólico” Pero de Guimarães Pereira, que erigiu a capela de São Sebastião, em 1603). (Arq. Distrital de Braga, 01.04.1648)

Em 1768, «sentença de emprazamento de três vidas do casal de Mangoeiro, sito na freguesia de São Pedro de Gondarém e foreiro ao Cabido de Valença, a favor de João Domingues e sua mulher e mais consortes» (Arq. Distrital de Braga, 16.11.1768).

Em 1783, «sentença apostólica e título de provisão de um benefício simples sito na igreja abadia de São Pedro de Gondarém, a favor do ilustríssimo Dom José de Almeida, cidade de Lisboa. (Arq. Distrital de Braga, 10.05.1783)                                                                                                                               

 Foreiros do Padroado

Aparecem, somente, três registos de foreiros, com a mesma data:

Em 1790, «prazo do meio Casal de Cima, sito na freguesia de São Pedro de Gondarém, Comarca de Valença, foreiro a mesma igreja, a favor de Benta Lourença, viúva de João Domingues, do lugar de Lagos, da mesma freguesia.  (Arq. Distrital de Braga, 04.05.1790)

Em 1790, «prazo do assento da Igreja de São Pedro de Gondarém, Comarca de Valença, foreiro a mesma Igreja, a favor de José Fernandes e sua mulher Maria Lourença, do lugar das Castanheiras, da mesma freguesia» (Arq. Distrital de Braga, 12.05.1790)

Em 1790. «prazo do casal do Assento da Igreja de São Pedro de Gondarém, Comarca de Valença, foreiro a mesma Igreja, a favor de Maria Lourenço, viúva de João Domingues Novo, do lugar do Ramilo, da mesma freguesia (Arq. Distrital de Braga, 13.05.1790).

  Pecadilhos do Padroado

Em 1611, surge uma «provisão de dispensação de Gonçalo do Vale, filho de presbítero et soluta, da freguesia de São Pedro de Gondarém, Comarca de Valença (Arq. Distrital de Braga, 1611-12-04). 

Em 1762, surge um «registo de provisão a favor de Maria Pereira, estalajadeira, do Campo da Vinha, para poder obrigar e demandar o Padre João Pereira, de Gondarém, comarca de Valença nesta Corte, perante o Vigário Geral. (Arq. Distrital de Braga, 29.07. 1762, São João do Souto, Braga).

Em 1783, surge uma «licença a favor do Padre Rodrigues Pereira, da freguesia de Gondarém para poder ter em sua companhia António, seu filho (Arq. Distrital de Braga, 22.09.1783).

Em 1820, "Autos de Querela" contra o abade da freguesia de Gondarém, António Pedro Pacheco, e  João Crisóstomo Guerreiro de Amorim Pereira, "Cónego da Sé", "por ter injuriado o autor (da queixa), declarando, em público, que se encontrava excomungado". Cf. (Arq. Nacional da Torre do Tombo).

Em 1839, "auto de querela contra os padres Sebastião Pereira Leite e António Pereira Leite, moradores em Gondarém, "por ofensas corporais, com ferimento", contra o padre frei José da Conceição, filho de Maria Lourença, de Gondarém, Vila Nova de Cerveira. (Processo incorporado no Tribunal Judicial de Caminha, em 2009). Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo).  

Em 1839, "auto de querela" por causa de João Pereira, egresso da extinta Ordem da Congregação do Oratório do Porto, morador na freguesia de Gondarém do concelho de Caminha; incorporado no Arquivo do Tribunal de Caminha, em 04 de julho de 2006. Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo, em 17.05.2012) 

Em 1877, "denúncia epistolar" por causa de «Carta enviada dos Arcos de Valdevez pelo padre João Sobrinho a Clara Malheiro, cuja resposta foi dada pelo padre João Manuel Barbosa, enviada de Gondarém, e, com data de 29 de Janeiro. Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo, 30.03.1877)

Em 1880, um "Auto de Querela" de "abuso das funções religiosas ao ter publicamente negado dar a comunhão à queixosa, Rosa Gomes, casada e moradora na freguesia de Gondarém; "auto de querela" movido pela própria e pelo ministério público contra o Padre Manuel Franco Pedra. Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo, 01.01.1880.)


Em 1882, surge uma queixa de «falsificação de registo de batismo do filho de Maria José Soares e João António, "auto de querela" movido pela queixosa e pelo Ministério Público, contra o Padre Manuel Franco Pedra. Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo, 01.01.1882) 


P.S.

Renovada em 1945, a Igreja Paroquial de Gondarém, adquire o estatuto de “personalidade jurídica” através da «Corporação Fabriqueira de São Pedro de Gondarém em Vila Nova de Cerveira”, em 16 de março de 1957, conforme acordo entre a Santa Sé e a República Portuguesa, e segundo o art.º 450 (Cód. Ad. de 1940). Por obra e iniciativa do Padre Américo de Sousa, são construídos os dois edifícios sociais adjacentes: "Centro Social" e "Casa das Mães"), (Cf. Arquivo "DDA" – Ministério de Administração Interna.).

a) Em 26 de abril de 1945, inicia-se a "Reparação e Ampliação da Igreja Matriz de Gondarém", a cargo da "Comissão Fabriqueira de Gondarém". Cf. (Arq. Distrital. de Viana do Castelo).

b) Em 6 de dezembro de 1951, inicia-se a "Construção do Edifício para a Sopa dos Pobres", sob direção do arquiteto Francisco Augusto Baptista, a cargo da "Comissão Fabriqueira de Gondarém". Cf. (Arq. Distrital. de Viana do Castelo).

c) Em 28 de agosto de 1956, inicia-se a "Construção do Centro de Formação Familiar de Gondarém", da autoria do arquiteto Francisco Augusto Baptista, a cargo da "Comissão Fabriqueira de Gondarém. Cf. (Arq. Distrital. de Viana do Castelo). 

d) Em 12 de janeiro de 1957, procede-se à "Reparação de Casas de Pobres e Construção de Casas do Património dos Pobres em Gondarém", segundo projeto do arquiteto Francisco Augusto Baptista, a cargo da Comissão Fabriqueira de Gondarém. Cf.(Arq. Distrital de Viana Do Castelo).

e) Em 22 de novembro de 1973, é criado o "Lar para Pessoas Idosas de Gondarém" pelo "Centro de Assistência Paroquial de S .Pedro de Gondarém. Cf. (Arq. Distrital de Viana do Castelo). 

f) Em 6 de agosto de 1981, por obra e iniciativa do Padre Abílio da Costa Oliveira, foi criada a instituição do “Centro Social e Paroquial de Gondarém em Vila Nova de Cerveira”,; equivalente a  (I. P. S. S.). (Cf. Arquivo DDA – Ministério da Administração Interna).

Adenda: «Quando, no século XIII, se dá um "benefício" - o rendimento duma terra - a um cura ou a um prelado qualquer, trata-se de assegurar a sua vida material, pois a terra é então a única fonte de riqueza». (Pernoud Régine, "o Mito da Idade Média",  Éd. du Seuil , Paris ,1977;  Ed. Pub. Europa/América, 2.ª, pg. 119, Lisboa, 1989).

Obs: Em 1988, surge a referência  da  «Associação dos Escuteiros de Portugal - Grupo 144 - Gondarém (Vila Nova de Cerveira), referente ao plano de atividades e a um pedido de subsídio»». (Arq. Nacional da Torre do Tombo, 05.03.1988).

 


EUROPOLITIQUE: Recordando "Platero y Yo" ....Juan Ramón Jiménez

  Na minha tenra idade escutava os poemas de “ Platero y yo” , com uma avidez e candura própria da inocente e singela juventude, que era o ...