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sábado, 24 de março de 2018
EUROPOLITIQUE: (5) "E SINTO QUE VOU MORRER..." Fado de "Vim morrer a Gondarém" - voz de Amália Rodrigues; poema de Pedro Homem de Melo
E grito, grito. Acudi-me
Ganhei dor. Busquei prazer.
E sinto que vou morrer
Na própria pátria do crime.
“Náufrago”, o poeta solta o grito de lamento prestes a iminente afogamento.
Certamente que não deitou o fardo ao rio, porque sabia nadar, nem a perícia da natação lhe faltava. Mas, aos outros, a aflição do afogamento arrastava-os como uma cruz que pairava no ar. No ar sibilavam os tiros e as balas, já que de meiguice, “nuestros hermanos”, não careciam. Os calabouços acolhiam facilmente os mais destemidos contrabandistas. Por isso, a fuga era o instinto natural do contrabandista.
Alguns arriscaram a vida, porque das artes de natação pouco sabiam; e, o rio em tempestade, e, com vento, não pressagiava bom mensageiro.
A escuridão e as trevas toldavam os caminhos e atalhos que se erguiam em socalcos e pela noite adentro. A chuva tolhia os corpos, e, o suor brotava com o peso das cargas, que se protegiam com a carícia e força dos braços. As “preciosas cargas” tinham destino marcado, de cuja marca nascia o próprio sangue, ou, a honradez do seu compromisso: - “nunca largues a carga”.
No cais de vela acesa jazia o corpo de um jovem, cheio de juventude, que pagou caro a sua ousadia.
O grito soltava-se quando as balas sibilavam pela calada da noite – “Deita a carga ao chão”- erguia-se a espingarda em riste. E, quando a coragem era maior soava sibilante, pela calada da noite ou do dia, a bala, ou, o tiro.
Quando a fome batia forte no estômago, as fatias de bacalhau seco soltavam-se alegremente dos seus fardos, amaciadas pela água doce do rio. A morte, a fome e a sede erguiam-se em grito de desespero.
“E grito, grito. Acudi-me”, nesta angústia, neste desespero que somente tem um lamento ou murmúrio de tempo e de vida.
O tempo de um grito, de um “ai”, porque sobre a cabeça o tiro, ou, bala cai.
Se, os contratos de carga não eram cumpridos, as ameaças pairavam no ar como raios de dinamite. A pólvora usada nas pedreiras tornava-se ingrediente de qualquer falha de compromisso, já que à “palavra dada” não se falta, e, se firmava com “mão certeira”.
(Mas, o “contrabandista profissional” tinha uma linguagem própria, que dois anos de ensino seriam insuficientes para tão grande mestria. Até a luta contra o “Estado e os impostos” eram habilmente demonstrados pela entrada de divisas no País, porque os lucros advinham da Espanha. Todavia, a "economia tipo casino", a poucos favorecia).
Nesta luta, “ganhei dor”, sofri e pelo sofrimento “busquei prazer”. A dor é a antítese do prazer, e sem dor não sabemos o que é o prazer.
“E sinto que vou morrer, na...” neste lugar da transgressão, neste lar revolto e embrulhado, nesta contradição daqueles que lutam pelo pão.
Bandoleiro, figura itinerante nos romances de Camila Castelo Branco que tem o sentido de "salteador" (= salteador de estradas, bandido), ou, ladrão (que participa em assaltos, violento); que rouba em estradas, azinhagas, florestas e atalhos ou locais ermos e que geralmente faz parte de um bando (por exemplo, José do Telhado).
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