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segunda-feira, 21 de setembro de 2020

EUROPOLITIQUE: Recordações da tristeza santiaguina nas ruas de Paris (Luis Sepúlveda)

Um certa tristeza e impotência desprendia-se do seu rosto quando normalmente estendia o seu olhar sobre a relva da “Cité Universitaire”. O tapete verde que circulava ao redor das casas de estudantes esmorecia taciturno quando se avistava “La Maison d’Espagne”. Vedada ao convívio estudantil, permanecia fechada como um “bunker”, que o regime franquista teimava em manter como símbolo da cultura hispânica. Por isso, quando a temática política ressurgia nos seus pensamentos, uma vaga de inconformismo e revolta mergulhavam-na numa certa onda de melancolia e terror. A “Casa de Espanha”, imprimia-lhe um novo e fundo poço de tristeza, que invadia aquela latino-americana, que nada devendo ao antigo processo de colonização, se relembrava da sua longínqua terra, cujas praias, afortunadamente, eram bafejadas pelo Pacífico. E, apesar da distância e da saudade, ecoava dentro do seu coração, aquela canção de Violeta Parra, do seu Santiago do Chile, já do ano de 1966: «Gracias a la vida que me há dado tanto…».

Por cima de todos os infortúnios, tristezas e alegrias, o sentimento de vida desabrochava florido como uma primavera. Os debates políticos, por vezes, eram bastante disputados e acalorados nas salas de tertúlia e nas mesas dos cafés que os chilenos ocupavam na margem esquerda do Sena; cantando, por vezes: «gratias a la vida que me há dado tanto...».

 O “Quartier Latin” rebentava pelas costuras de refugiados políticos, anarquistas, idealistas de todas as fações. Mas, no meio desta turbulência de ideais, surgia uma certa e profunda tristeza, que se aproximava deste personagem: “recorda-se de que uma vez, durante o exílio em Paris, lera um romance de Ramón Diaz Eterovic, intitulado “La ciudad está triste”, e, encostado ao balcão de la Petite Périgourdine, o bar de Saint-Michel onde, sem motivo aparente, iam sempre parar os latino-americanos, tinha chorado com a descrição magistral da tristeza santiaguina feita pelo autor. (Sepúlveda, Luís -  “A sombra do que fomos”, pg.17, 1.ª Ed., Porto Editora, Lisboa, 2009).

Por ironia do destino e aproximação geográfica, ao cântico chileno de “Gratias a la vida que ma ha dado tanto...” juntava-se a melodia do “Funeral de um Lavrador”, que do Brasil ecoava pela voz de Chico Buarco, dois anos mais tarde, em 1968.

«Esta cova em que estás com palmos medida
É a conta menor que tiraste em vida
É a conta menor que tiraste em vida

É de bom tamanho nem largo nem fundo
É a parte que te cabe deste latifúndio
É a parte que te cabe deste latifúndio»


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